" Havia um homem que não gostava de ver sua sombra nem suas pegadas.
Para escapar delas, corria, corria, e quanto mais corria, mais pegadas surgiam no chão e com mais facilidade a sombra o perseguia.
Pensando que isso acontecia porque estava indo devagar demais, acelerou o ritmo e saiu desembestado, campo afora, até que caiu de exaustão e morreu.
Se tivesse ficado quieto, não haveria pegada alguma.
Se tivesse parado tranquilo sob uma sombra, a sua própria sombra teria desaparecido."
Chuang-Tsé
12- HOFF, Benjamin. O Tao do Pooh. TRIOM, 1982.
O que é a Sombra? O que significa isso?
A Sombra é a parte reprimida de nós mesmos.
Quem se empenha no auto-conhecimento e/ou vive uma vida de entrega ao serviço espiritual, em qualquer tarefa que possa ser, se não olhar para sua Sombra e trabalhar sobre isso, acaba por encontrar problemas originados nessa dimensão de vida.
Para algumas pessoas é difícil lidar com o corpo, com a sexualidade e com o feminino.
Muitas vezes é preciso encarar os medos. O que está por detrás.
Segundo uma lei taoísta: "Cada coisa atrai o seu contrário".
Por exemplo: Falar muito da Luz atrai muita sombra.
Todo Ser de Luz tem uma sombra. Precisamos conhecer e reconhecer. Pois se não o fizermos poderemos correr o risco de projetar sobre o outro. E descarregar o negativo de nossa sombra reprimida em alguém que poderá ser alvo de nossa negatividade reprimida, ou então, a sombra se volta contra nós mesmos, em eventos externos e internos.
Amamos estar na Luz, porém não amamos a nossa sombra. Ocultamos.
Para os Antigos Terapeutas e Graf Durckheim, segundo o livro "Terapeutas do Deserto" de Leonard Boff e Jean-Yves Leloup, no capitulo que fala sobre as Sombras, da qual me inspiro para escrever esse artigo, ele diz: - "Não há caminho para à Luz que não faça travessia da Sombra".
E diz, "Não se trata de procurá-la, não se trata de se comprazer nela, trata-se de atravessá-la. E isto vai nos permitir fazer a diferença entre o verdadeiro místico e o mistificador. Aquele que não conheceu sua sombra, aquele que não reconhece os seus limites, o que ele pode reprimir em diferentes níveis, conhecerá apenas uma falsa luz, um ofuscamento. A verdadeira luz não se vê, mas ela nos permite ver. Ela nos permite ver todas as realidades, mesmo as mais terríveis, no exterior e no interior.
E aqui vou reproduzir o que Graf Durckheim fala sobre as diferentes sombras:
A primeira sobra é a repressão da agressividade. Esse impulso recalcado irá produzir uma couraça que irá aprisionar o individuo.
A questão fica em como direcionar essa energia de forma construtiva. Não se nega, apenas tomamos consciência, aceitamos e direcionamos de outra forma.
Segunda fonte de sombra é a sexualidade. Que diz que se nós podemos reprimir a sexualidade, a libido, não podemos reprimir o Eros. Não devemos recalcar em nós essa dimensão erótica da Sexualidade.
E reproduzo aqui na integra um paragrafo extraído da leitura do livro Terapeutas do Deserto: - "E Graf Durckheim diz que não se deve recalcar em nós esta dimensão erótica da sexualidade, do Eros no sentido antigo do termo. Quer dizer, um sexo que tem asas, um sexo alado verdadeiramente humano e capaz de nos abrir às dimensões da transcendência. Não se trata de negar esta dimensão que existe no interior da sexualidade, porque, se tirarmos as asas do falo, ficaremos com um falo impotente e estéril. Não podemos nos arriscar a passar ao largo do amor propriamente humano. Assim, a repressão da sexualidade não é simplesmente a repressão da expressão genital da sexualidade. É a repressão de todas as cores do arco-íris, de todas as manifestações do amor: da ternura, do serviço, do devotamento, do perdão, da gratidão, da gratuidade, todas estas qualidades que nós já evocamos.
Através de uma verdadeira experiência amorosa pode-se trilhar um caminho espiritual real. Durckheim dizia que Freud recusava esta dimensão espiritual da sexualidade
e que isto estava ligado à sua recusa pela música. Freud não gostava de música. É interessante notar que o amor pela música pode introduzir uma música no interior de nossas relações. Senão ficamos somente com as palavras e perdemos a melodia, o canto do encontro."
Terceira fonte de Sombra: Repressão do Feminino, tanto no homem como na mulher.
O Masculino está muito presente na vida humana. Onde é valorizado a técnica, o êxito social e a importância da análise em detrimento do amor, da receptividade e do silêncio.
O feminino é a dimensão do contemplativo. É belo fazer e agir, mais também é muito belo não fazer e não agir. Apenas olhar a beleza, estar, ficar no silêncio.
O feminino tem muito haver com o silêncio e com a prece. Com a interiorização e com o estar em solicitude.
Estar em prece, em comunhão com o Divino.
O Jejum é uma prática que tem haver com o feminino, pois tem o objetivo não só de purificação, mais também para vencer o consumo e quebrar com condicionamentos, experimentando o novo.
E por falta de parar, de ouvir, de diminuir o ritmo, de silenciar é que destruimos uns aos outros. Destruimos o planeta, não ouvimos os apelos da natureza. Nem a natureza do pedido da sabedoria de nosso corpo e nem de nenhuma dimensão.
Devemos dar atenção e a intenção a dimensão do contemplativo do nosso Ser.
Para ser um Terapeuta em ressonância com os antigos Terapeutas de Alexandria é preciso passar pela Sombra, e falo isso por ser Terapeuta em ressonância com a escuta a partir do Ser, e por estar constantemente dialogando com minha sombra, vendo, passando por ela e iluminando regiões escuras da minha vida interior.
Com isso vou reconciliando com a Dimensão do Feminino e sentindo a dimensão do Espiritual desde um outro lugar dentro de mim mesmo. É um profundo respeito e um ato de amor próprio. Importante para ser um agente de cura, estar a serviço e cuidar do outro a partir do Ser.
Um outro aspecto da Sombra é a repressão da individualidade criadora. É poder ser responsavél por sua criação, e estar fazendo algo que lhe agrada. E não reprimir essa dimensão e ter consciência do que significa isso em sua vida. E dar conta de olhar para isso.
Eu aqui mesmo no meu Blog, foi muito dificil relaxar e poder escrever a partir de um lugar dentro de mim que era da criatividade. Eu me permiti me expor e correr riscos. E com isso vou crescendo também, apesar das criticas e de tudo mais.
Quando não expressamos nossa criatividade, esse tipo de repressão acaba ido para a sombra, traz muitas doenças e infelicidade. É bom descobrir o que se oculta, o sonhos, desejos, talentos, aptidões que foram reprimidos e deixar desabrochar.
Assim como não podemos reprimir a agressividade, sexualidade, criatividade, também não podemos reprimir a Dimensão do Ser Essencial. A dimensão da Espiritualidade.
A espiritualidade nesse interim tem um significado profundo de encontro consigo mesmo e de estar se completando nas mais diversas dimensões da vida, com essa qualidade de consciência e amor.
Cida Medeiros