Biosofia nº3 - Outono de 1999
Vidas Maiores
Annie Besant - A Magia do Verbo
Embora Annie Besant tenha escrito, algures, que nenhum outro epitáfio para si mesma desejava excepto o de que "ela procurou seguir a Verdade", a sua figura é tão imensa e luminosa, que os mais belos adjectivos, os mais inspirados epítetos lhe foram consagrados por muitos dos que se puderam inteirar da sua natureza ímpar. Entretanto, para nós, a mais expressiva de todas as imagens deve-se a Charles Blech, Secretário-Geral da Soc. Teosófica de França no princípio do século: "A Alma de Diamante". Annie Besant foi, sim, (um)a alma de diamante – tão forte e tão delicada, tão bela e tão resistente, brilhando intensamente em tantas e tantas facetas…
Infância, Juventude, Casamento e Separação
Annie Wood nasceu em 1 de Outubro de 1847, em Londres, mas a sua ascendência tinha uma forte componente irlandesa, raiz que sempre lhe agradou. Os avós pela parte da mãe - mulher de grande sensibilidade - eram ambos irlandeses, o mesmo acontecendo pelo lado materno do pai - homem de sólida cultura humanista, matemático e professor de Francês, Alemão, Italiano, Espanhol e… Português.
O pai de Annie morreu dias depois de esta completar cinco anos. Iniciou-se então uma época difícil para a mãe viúva, tanto do ponto de vista emocional, como económico. No entanto, aos oitos anos, quando (com o irmão Henry e a mãe) foi viver para Harrow, numa casa antiquíssima que se abria para um amplo jardim, de luxuriante arvoredo, Annie viveu um período feliz. Escreveu ela, na sua Autobiografia: "Não havia ali árvore a que eu não tivesse trepado, e uma delas, um frondoso loureiro de Portugal, era a minha morada predilecta. Ali tinha o meu dormitório e a minha estância, o meu estudo e a minha despensa. Nesta, guardava as frutas que podia colher livremente das árvores e, no estudo, permanecia horas sentada, com alguns dos meus livros favoritos".
Entretanto, a Sra. Marryat, irmã de um conhecido escritor da época, ofereceu-se para providenciar a Annie uma educação esmerada. Tal foi aceite, embora implicasse que Annie passaria menos tempo com a mãe - uma decisão bem difícil visto que, citando mais uma vez as palavras da nossa heroína, referindo-se à mãe, "o meu amor por ela era idolatria, e o seu por mim era devoção". Ainda que só se reunindo nos períodos de férias, "o vínculo de amor entre nós duas foi tão tenaz que nada pôde rompê-lo".
A Sra. Marryat tinha alma de educadora, do que beneficiava um conjunto crescente de raparigas e rapazes ("eu jogava críquete e sabia trepar como o melhor deles"). Este último facto era inusual na época, como se sabe. Annie, cujo sentido de reverência, respeito, gratidão e lealdade foram exponenciais durante toda a vida, enalteceu aquela amiga: "Careço de palavras para expressar o que lhe devo, não somente em conhecimentos mas, também, em amor pela sabedoria, que desde então viveu em mim como um constante estímulo para o estudo".
O tipo de educação que recebia, tanto da mãe como da Sra. Marryat, acentuaram a natural religiosidade do carácter de Annie, para quem os sonhos místicos, as visões de fadas e duendes, o entusiasmo ao ler os contos dos primitivos mártires cristãos - que sonhava viver por si mesma -, a citação dos textos evangélicos, eram muito mais sedutores do que os afazeres e os prazeres da vida terrena quotidiana. A sua devoção religiosa de então tinha o selo do arrebatamento e da generosidade que caracterizaram toda a vida de Annie - ela só sabia ser autentica e seriamente, não importando quais as circunstâncias ou campo de actividade.
Tal veio a conduzir a que, aos 19 anos, sem jamais ter tido namoros ou nisso pensado seriamente - pois seus ideais haviam sido "minha mãe e o Cristo" -, ficasse noiva do Reverendo Frank Besant, com quem casou um ano e três meses depois. O seu futuro marido tomou como interesse amoroso uma convivência que, para Annie, mais não era do que a oportunidade de conversar sobre temas religiosos. Aturdida de surpresa quando Frank a pediu em casamento, permaneceu em silêncio, envolta em sentimentos de culpa por haver dado azo à situação; tais sentimentos, levados ao extremo, combinados com a esperança de que, como "esposa de um pastor, melhor do que de outras maneiras, teria oportunidade de praticar o bem", levaram-na a vencer a sua "aversão ao matrimónio" e a comprometer-se. Já noiva, tentou romper o compromisso mas não foi além da tentativa, para não magoar a sua mãe, que considerava suprema desonra se a filha faltasse à palavra dada. Assim, sem entusiasmo e sem preparação, casou (ou melhor, deixou-se casar). Leviandade e irresponsabilidade - pensarão alguns; consequência da diferente focalização dos seus interesses (que a tornou menos sagaz e desperta para as "coisas comuns") e de um escrúpulo, sentido de lealdade e de não magoar levados ao extremo - pensamos nós. Um amigo de Annie, comentou a propósito, com extraordinária exactidão: "Como ela não podia ser noiva do céu, tornou--se noiva do Senhor Frank Besant, que dificilmente seria um substituto adequado".
De facto, não o foi. A aspereza miudinha de Frank suscitou em Annie Besant (A.B.) "primeiro, incrédula estranheza, depois uma torrente de lágrimas de indignação e, passado algum tempo, uma resistência orgulhosa, desafiadora, fria e rígida como ferro. A desenvolta rapariga, radiante, impulsiva, ardorosa, entusiasta, transformou-se - e bem rapidamente - numa grave, altiva e reticente mulher, que sepultava sob as profundidades do coração todas as suas esperanças, temores e desilusões". Assim, o único feliz resultado do casamento foram dois filhos (um rapaz e uma rapariga), unidos para sempre a Annie por um enlevado amor, e particípes, quando adultos, das nobilíssimas causas a que se consagrou. Tudo o resto, constituiu um tormento para A.B., nomeadamente as visitas sociais de senhoras cujas conversas a "enfastiavam enormemente, e que eram tão indiferentes a tudo o que me enchia a vida - teologia, política, ciência - como eu o era às suas discussões sobre o noivo das suas empregadas e as extravagâncias das suas cozinheiras".
As Dúvidas Cruéis...
Rapidamente, entretanto, cruéis dúvidas de âmbito religioso a torturaram até às fibras mais íntimas. Damos de novo a palavra à própria Annie Besant, que eloquentemente expressou o quanto isso podia significar: "Só por uma imperiosa necessidade intelectual e moral, uma mentalidade religiosa se sente arrastada para a dúvida, porque ela representa uma comoção que faz sossobrar os fundamentos da alma e que tudo faz vacilar: nenhuma vida debaixo do vácuo céu, nenhuma luz na obscura noite, nenhuma voz a quebrar o mortal silêncio, nenhuma mão que se estenda, salvadora. Os frívolos de cérebro vazio, que nunca tentaram pensar, que aceitam as crenças como aceitam as modas (…), na sua superficial sensibilidade e ainda mais superficial mentalidade, não podem nem por assomo imaginar a angústia que produz a mera penumbra do eclipse da fé e, menos ainda, o horror da profunda escuridão, em que a alma órfã grita no vazio infinito…".
Que dúvidas eram essas, que lhe tiravam o sono de muitas noites e a própria vontade de viver? Não eram as pequenas superficialidades sociais com que os chamados fiéis (na verdade alheios à vivência religiosa, salvo no sentido de, à cautela, fazerem um seguro para o Céu e a Protecção Divina) se ocupam uma, duas, três vezes na vida, ou que os media realçam dos discursos papais ou de outras autoridades eclesiásticas; tão-pouco eram preocupações com a sua salvação pessoal mas, sim, no essencial: "Pode, acaso, haver um castigo eterno depois da morte, como sustentam as Igrejas? Existindo um Deus bom, como pôde criar a Humanidade, sabendo previamente (presciência divina) que a maioria dos homens sofreria para sempre as torturas do inferno? Existindo um Deus equitativo, como podia permitir a eternidade do pecado, de maneira que o mal fosse tão duradouro como o bem? Como explicar os pontos de semelhança entre religiões mais antigas e o Cristianismo, se havia sido educada na convicção de que este era a única religião verdadeira, sendo falsas todas as outras?
Estes e outros problemas similares tocavam em pontos tão importantes e sérios para Annie que (não encontrando resposta satisfatória, depois de exaustiva busca) lhe impediram de se continuar a considerar cristã ou sequer, como o marido pretendia impor, de participar em actos e cerimónias que pressupunham que o fosse. Diante das mais sérias interrogações sobre o sentido da Vida, ela não podia fingir, nem para si mesma nem para ninguém. (Anos mais tarde, ao renunciar ao materialismo, definiu a exigência que a verdade, fosse qual fosse, lhe suscitava, dizendo: "… não me atrevo a comprar a paz com uma mentira; imperiosa necessidade me induz a dizer a verdade tal como a vejo, agradem ou não as minhas palavras, receba louvor ou vitupério. Devo manter imaculada esta fidelidade ao verdadeiro, mesmo que me custe amizades, mesmo quebrando laços humanos. A verdade poderá conduzir-me a um deserto, poderá privar-me de todo o afecto - mas devo segui-la. Ainda que me tirasse a vida, confiaria nela").
Assim, quando o marido lhe deu a escolher entre duas únicas opções, a submissão ao fingimento ou a separação, esta foi inevitável, por muito incómoda, dura e até escandalosa que fosse na época. Tendo sido difícil a luta pela sobrevivência que se seguiu, bem mais dolorosa foi a privação da custódia dos seus filhos, imposta em tribunal por homens cheios de preconceitos religiosos. A decisão fundamentou-se, exclusivamente, nas opções filosóficas de Annie que, diziam, não lhe permitiria ser uma boa educadora. No entanto, tão logo atingida a maioridade e a liberdade de escolha, ambos os filhos se juntaram à mãe, que continuaram adorando com devoção e orgulho…
Trabalho Social e Político
Depois da separação, com apenas 25 anos de idade, Annie dedicou-se mais do que nunca às questões religiosas e filosóficas que a atormentavam, alargou mais e mais o seu interesse pela política e pela ciência, ampliou a sua cultura até níveis extraordinários, o que mais tarde lhe permitiria tratar com à vontade qualquer questão que, mesmo inesperadamente, se lhe apresentasse. As pessoas surpreendiam-se ao ver aquela jovem de rosto simultaneamente formoso e grave, seria e austeramente concentrada nas mais abstrusas leituras.
A sua reflexão sobre as questões religiosas conduziu-a até posições de agnosticismo (foi Vice-Presidente da Nacional Secular Society); tendeu para o ateísmo mas com um sentido tão profundo e uma concepção tão entranhada do uno (uma eterna e única substância) oculto no múltiplo, que uma estreita linha a separava (temporariamente, como veremos) de um esclarecido misticismo e de uma visão hylozoísta do universo; sustentou uma ética de rigoroso altruísmo e escrupulosa dignidade, fundada no dever da correcção pela correcção e não, como acontece na postura religiosa comum, na esperança de qualquer prémio ou no receio de qualquer castigo.
Ao mesmo tempo, interessou-se vivamente pelas agudas questões sociais de então - tendo, a certa altura, chegado a ser uma destacada militante socialista ("um socialismo de dar e não de tomar", como escreveu no seu livro "O Mundo de Amanhã"), pelos direitos das mulheres, de que foi uma verdadeira campeã (assumindo pioneiramente posições que só muito mais tarde se foram generalizando) e, em geral, pelo reconhecimento pleno das liberdades de expressão (nesse campo, muito é devido a ela e a um punhado de companheiros de então). Em todas estas causas se empenhou com extraordi-nário ardor, intrépida coragem e notável talento oratório e literário, tendo convivido com homens
de vulto como Charles Bradlaugh (um dos maiores amigos em toda a sua vida) e George Bernard Shaw (que por ela nutriu a mais viva admiração).
Assim, em plena década de 1880, Annie Besant era uma figura largamente reconhecida e famosa, especialmente na Grã-Bretanha. Entretanto, por detrás do seu carácter voluntarioso e do vigor da sua inteligência, existia um enorme coração, cheio de ternura, que se expressava através de múltiplas actividades fliantrópicas, de uma constante solicitude perante a dor, de amizades vividas com amplo sentido de fraternidade. Simultaneamente, ia constatando a insuficiência das suas concepções materialistas, quer como explicação do Universo e da Vida, quer como força suficientemente congregadora e regeneradora da Humanidade. Deste modo, continuava a reflectir e a buscar profundamente…
O Encontro com a Teosofia e com HPB
No início de 1889, uma das suas actividades era a de jornalista (em colaboração estreita com o Sr. W.T. Sead, de convicções cristãs, numa demonstração de que homens e mulheres de boa vontade se podem sempre entender no essencial). Foi nessa qualidade que, para fazer uma crítica literária, lhe chegaram às mãos os dois grossos primeiros volumes da incomparável obra "A Doutrina Secreta" (com o subtítulo "Síntese da Ciência, da Religião e da Filosofia"), de H.P.B. - Helena Petrovna Blavatsky (Ver o número 1 de "Biosofia").
Annie Besant levou os livros para casa e, ao lê-los, ficou assombrada. Os véus descerravam-se. Ali estavam as ligações que antevira e procurava, mas que ainda lhe faltavam, para aceder da ciência puramente materialista à ciência do espírito, à filosofia integral, à divina sabedoria ("teo"+"sofia"). Damos-lhe de novo a palavra: "Como me era familiar o assunto! Como voava a
minha mente, pressentindo as conclusões! Quão natural me parecia o tema, quão coerente, subtil e inteligível! Estava maravilhada, ofuscada pela luz que me mostrava tantas partes de um grande todo e resolvia todas as minhas dificuldades, enigmas e problemas".
Redigiu a crítica, naturalmente brilhante e entusiasmada, e escreveu a Helena Blavatsky, pedindo permissão para a visitar. A resposta foi afirmativa e H.P.B. recebeu-a com um veemente aperto de mãos, exclamando: "Ó querida Senhora Besant! Há quanto tempo eu desejava conhecê-la". Este primeiro encontro deixou uma forte impressão em Annie, que pouco tempo depois repetiu a visita, informando-se melhor sobre como ingressar na Sociedade Teosófica (ST). H.P.B. olhou-a penetrantemente e deu-lhe um relatório, com cerca de 4 anos, da Society for Psychical Research (SPR), pedindo que o lera antes de se decidir. (Vem a propósito referir que esse famigerado relatório, elaborado por uma única pessoa, retratava HPB como uma impostora fraudulenta. Escrito com o mais puro sectarismo, ainda hoje é mencionado na generalidade dos livros e enciclopédias da "cultura oficial" sobre HPB e a ST. Não obstante, foi a própria SPR a reconhecer, através de muitos dos seus membros - alguns, aderiram mesmo à ST - e, mais tarde, publica e expressamente como instituição, o carácter tendencioso, parcial, infundamentado e insubsistente desse relatório - mas esta reposição da verdade é omitida nos mesmos livros e enciclopédias. Assim se espezinham reputações!…).
Annie leu o relatório e rapidamente verificou a sua inanidade. Ademais, "como podia eu aceitar tudo aquilo contra a natureza franca, leal, destemida de que eu percebera um vislumbre? Contra a altiva e ardente sinceridade que resplandecia daqueles olhos honrados e impávidos, cheios de infantil nobreza?". Deste modo, logo no dia seguinte, formulou o pedido de ingresso na Soc. Teosófica. Depois de receber a resposta positiva, dirigiu-se a casa de H.P.B. Eis o relato dessa visita, pela pena de A. Besant:
"… encontrei H.P.Blavatsky sozinha; aproximei-me dela, inclinei-me e beijei--a sem proferir uma palavra. - 'Você ingressou na Sociedade?' - 'Sim.' - 'Leu o relatório?' - 'Sim.' - 'E então?' Caí de joelhos, apertei as suas mãos entre as minhas e, fitando-lhe os olhos, respondi: - 'Quer aceitar-me como discípula e dar-me a honra de a proclamar ao mundo como minha instrutora?' O seu austero semblante se modificou e lágrimas irreprimíveis lhe arrasaram os olhos; depois, com dignidade mais do que régia, colocou a sua mão sobre a minha cabeça, dizendo: Que nobre mulher é você! Que o Mestre a abençoe!"
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Que momento tão raro, sublime e extraordinário o do (re)encontro desses dois gigantes do espírito - um abraço inolvidável, um reconhecimento vindo das profundezas do tempo, uma celebração de uma fraternidade sem mácula, uma passagem de testemunho por evidência de legitimidade!
De facto, nos anos seguintes, e ao longo dos restantes 44 anos e meio da sua vida, Annie Besant não perdeu oportunidade de defender a sua grande Amiga (a que terá compreendido mais intima e profundamente do que ninguém), de dar a conhecer ao mundo a sua obra, de pôr em relevo a sua imensa Sabedoria e nobilíssima estirpe. Fê-lo de modo desassombrado, inequívoco, entusiástico - com o entranhado sentido de gratidão e honradez que sempre a caracterizou.
Neste artigo, porém, interessa sobremaneira realçar que também H.P.B. se referiu de forma repetida - e altamente elogiosa e enfática - ao carinho, enlevo e admiração que A. B. lhe despertou. Citemos algumas palavras escritas pelo próprio punho de Helena Blavatsky: "A minha amiga e colega, Annie Besant, que é hoje o meu braço direito"; "Os discursos foram feitos por Sinnett e outros mas, é desnecessário dizer, ninguém falou tão bem como Annie Besant. Oh, Céus, como esta mulher fala! Espero que você possa ouvi-la"; "Que mulher de grande coração, nobre e maravilhosa ela é!"; E, sintetizando tudo numa frase, assim definiu H.P.B. a Annie Besant: "única", "incomparável".
Desta forma, havendo com ela convivido somente dois anos (bem menos do que com outros companheiros de trabalho), Helena transmitiu a Annie a liderança espiritual, do núcleo mais interno, da Sociedade Teosófica (permanecendo o Coronel Olcott como seu Presidente) e fez claramente constar essa sua vontade, antes de morrer, em Maio de 1891.
Também, aliás, o Cor. Olcott veio a expressar a sua extremada e intocável admiração por Annabay. Três
ou quatro (entre tantas) passagens do seu livro "Old Diary Leaves" bastam para o ilustrar: "Ela é, na verdade, o agente escolhido para fazer frutificar as sementes que foram lançadas por H.P.B. e por mim durante os anteriores quinze anos"; "Nunca encontrei uma mulher mais consistentemente religiosa do que ela, nem cuja vida tenha sido um mais alegre auto-sacrifício. As minhas bendições estarão com ela, onde quer que vá"; (comentando uma digressão pela Índia, em que acompanhou Annie Besant para esta proferir uma série de conferências) "recordo a mais esplêndida série de discursos que ouvi em toda a minha vida, e a íntima fraternidade com uma das mulheres mais puras, mais altamente inteligentes e mais elevadas em termos intelectuais e espirituais da sua geração ou de qualquer outra época histórica de que eu tenha conhecimento"; "posso conscientemente afirmar que em toda a minha vida nunca encontrei uma mulher mais nobre, altruísta e íntegra nem uma cujo coração estivesse cheio de um maior amor pela humanidade".
A Melhor Oradora do Mundo
No campo teosófico, Annie Besant veio encontrar a possibilidade de conciliar a sua natureza mística com uma só-lida filosofia, a ciência das coisas físicas com a ciência dos mundos suprafísicos, a liberdade de pensamento e de expressão com uma rigorosa noção de ética, de dever e de ampla filantropia; chegou a uma base sólida e motivadora da fraternidade universal; pôde, enfim, identificar-se com uma concepção do Divino destituída dos habituais antropomorfismos; deparou-se com a demonstração de que existe uma Sabedoria Perene, uma Ciência Universal, uma Religião-Sabedoria de que procedem todas as grandes escolas filosóficas espiritualistas e todas as grandes religiões, sem que (por isso) a verdade de uma exclua a verdade das outras.
Deste modo, A. B. entregou-se ao novo trabalho, que abraçou com toda a força de alma, com uma generosidade que jamais mediu sacrifícios, com um ânimo inquebrantável de lutadora, entretecido numa espontânea afectividade, numa ampla cultura e num génio literário e oratório que rapidamente a tornaram na mais celebrada figura da Sociedade Teosófica. Representou, desta forma, uma fonte de prestígio, de brilho e de solidez para a ST, contribuindo mais do que ninguém para o seu rápido crescimento em número de membros e em pujança no mundo.
Pouco tempo depois da sua adesão, disponibilizava a sua casa para aí se sediar a ST de Inglaterra, visto não ser possível continuar a pagar a anterior localização. O seu contributo para o crescimento da biblioteca da sede mundial da ST em Adyar (um importante centro de pesquisa não somente para teósofos mas, também, para inúmeros estudiosos e eruditos) foi igualmente de relevo nos anos que se seguiram.
Escreveu inúmeras obras (há mais de quatro centenas de livros e opúsculos da sua autoria!), nas quais desdobrou e apresentou de modo mais simples e claro
os profundos conceitos da "Doutrina Secreta", além dos que resultavam da sua própria investigação e do estudo (integrado) das fontes tradicionais. Alguns dos
seus livros - por exemplo, "A Antiga Sabedoria", "Um Estudo sobre a Consciência", "O Cristianismo Esotérico", "O Mundo de Amanhã", "Evolução da Vida e da Forma", "A Genealogia do Homem", "Sete Grandes Religiões" (os dois últimos, reproduzindo uma série de conferências) - podem considerar-se verdadeiros tesouros, sendo todos os restantes de grande interesse e utilidade.
Foi, todavia, enquanto conferencista que o seu trabalho atingiu maior brilho e fulgor. Tal havia sido antecipado por H.P.B. quando, confirmando uma importante experiência espiritual de Annie, assinalou, não obstante, que o seu trabalho principal seria "A Magia do Verbo". Contam-se por muitos milhares as palestras que Annie Besant realizou, chegando a proferir três no mesmo dia. Por exemplo, nos 50 dias entre 16 de Novembro de 1893 e 7 de Janeiro de 1894, na Índia, deu um total de 48 conferências. Falava invariavelmente de improviso e com pequeno tempo de preparação dos temas. O magnetismo e a autoridade que dela emanavam, a fluência rítmica dos discursos e a força das imagens, a concatenação das ideias e a solidez dos argumentos consagraram-na como "a mais brilhante conferencista de Inglaterra", "a melhor oradora da sua época" (Bernard Shaw) e, segundo muitos testemunhos, "a melhor oradora do mundo" (esta última expressão encontra-se, por exemplo, num livro de M. Lutyens, basicamente hostil à ST e depreciativo de A.B.). O dramaturgo e novelista Enid Bagnold comentou a propósito de uma conferência de Annie Besant no Queen's Hall de Londres (1912) : "Quando ela subiu à plataforma para discursar, estava flamejante. A sua autoridade chegava a todo o lado".
Os seus discursos culminavam quase sempre numa torrente de aplausos, que se chegavam a prolongar por dez minutos - numa conferência na Sorbonne, em 1910, prosseguiram longamente já fora da sala. A sua primeira série de conferências na Índia (em 1893/94) foi um sucesso tão grande que, rodeada de multidões, chegou a ter que falar sobre pequenas plataformas, do diâmetro de um chapéu, em equilíbrio precário - e, à medida que o seu prestígio se avolumava, mal podia circular pelas ruas, entre as gentes que a queriam ver, tocar, expressar a sua admiração e gratidão. Discursando para 5.000 pessoas, sem meios de amplificação, era tal a penetração da sua voz e de tal modo impressionante e quase sagrado o silêncio dos ouvintes, que se fazia ouvir por todos, mesmo quando baixava o tom para alguma passagem mais íntima e tocante. Em 1900, em Paris, foi tão grande o seu triunfo ao discursar num congresso que, depois de acabar, e
enquanto voltava para o lugar, caminhou dezenas e dezenas de metros sob o clamor entusiasmado da assistência, que a cobria de flores atiradas à sua passagem - coisa ali jamais vista. Estes factos eram tão mais notáveis, quanto é certo que nada havia nela de teatralidade ou de apelo ao culto da personalidade - pelo contrário, inúmeras vezes fez questão de expressamente o recusar.
Por todos os Meios
Foi, portanto, com absoluta naturalidade que, em 1907, após a morte do Coronel Olcott, se deu a sua eleição para Presidente da Sociedade Teosófica - de acordo, aliás, com a vontade que o seu antecessor manifestara -, cargo que exerceu durante 26 anos.
A pujança que a ST havia alcançado e o admirável génio de Annie Besant, conjugadamente com o conhecimento de certos riscos mas, também, de certas oportunidades cíclicas - impossíveis de expor neste artigo, por razões de espaço - fizeram-lhe surgir a esperança de se poder induzir uma grande mutação nos valores dominantes no mundo (tão caracterizados pela ignorância, pela superficialidade, pelo sectarismo e pelo ódio, de que os grandes conflitos e horrores deste século XX são exemplos evidentes), substituindo-os pela cultura superior do espírito, pela fraternidade de todos os povos, pela síntese do Poder, do Amor e da Sabedoria, pela acção concertada dos labores político, científico, filosófico, artístico, pedagógico e filantrópico, unidos por um revigoramento religioso, no seu sentido universal e inclusivo.
Assim, cheia de energia e de sensibilidade pelo sofrimento alheio, A.B. trabalhou intensamente em todos estes sectores e apelou ao trabalho, à generosidade e à congregação de esforços de todos os que podiam contribuir para a cons-trução de um mundo melhor. O seu trabalho, a partir da Soc. Teosófica, multiplicou-se em tantas facetas e institui-ções vocacionadas para o Serviço à causa da evolução da Humanidade, que seria exaustivo enumerá-las. Sentiu, entretanto, que era necessário uma figura de referência que pudesse incutir um novo impulso à espiritualidade humana, congregando as forças de regeneração, e (juntamente com C.W.Leadbeater) julgou havê-la encontrado num jovem hindu, de apenas treze anos: J.Krishnamurti. Este veio, efectivamente, a ser um homem excepcional, um dos mais reconhecidos pensadores do Séc. XX, embora tenha enveredado por caminhos algo diferentes dos trilhados pela grande protectora da sua juventude e (no nosso entender meramente pessoal, ainda que muito convicto) tenha mostrado bem pouca gratidão para quem o reconheceu contra toda a evidência formal (aos treze anos, era considerado muito pouco inteligente pelos seus professores e por todos quantos o conheciam), o retirou da miséria, o rodeou de carinho, o educou primorosamente, o projectou para a notoriedade mundial e ainda soube ter solicitude e fraternidade quando essa mesma notoriedade foi usada contra aqueles que a haviam propiciado… Não resistimos à tentação de pensar o que poderia ter acontecido se as coisas houvessem sido de outra forma, quer da parte de Krishnamurti, quer da parte de alguns membros da ST menos sensatos e lúcidos. Na verdade, na verdade, o problema talvez fosse este: Annie Besant, havia apenas uma…
A Índia Bem-Amada
Embora continuando a viajar por todo o mundo, transportando o seu entusiasmo, as suas sempre novas iniciativas, a sua palavra inspirada e alentadora, foi na Índia que, a partir de 1893, Annie encontrou o seu lar. Foram impressionantes a sua dedicação pelo renascimento da cultura e da espiritualidade hindu, o seu amor pelas gentes entre as quais elegeu viver, a sua constante atenção pelos problemas contemporâneos e pelas perspectivas futuras da velha Ariavarta (ou seja, a terra dos antigos hindus). Ela foi uma corajosa anti-colonialista avant la lettre, com a singular peculiaridade de ser nativa do país colonizador. Dirigindo--se aos povos ocidentais, num trecho significativo, escreveu algures: "A Índia tem muito a oferecer-vos no domínio religioso. Pode dar-vos uma religião científica, coisa que mal haveis sequer imaginado. Aqui (no Ocidente), a religião, frequentemente, mais não é do que uma crença cega ou um delírio emocional. Na Índia, a religião é intelectual e científica. A psicologia hindu faz parte da religião. A Índia compreende o mental e o espírito, e sabe como podem ser desenvolvidos e treinados. No que o Oriente e o Ocidente, quanto a isso, diferem, é que a ciência ocidental é limitada ao mundo físico enquanto a Índia é científica na sua religião e conduz a ciência no domínio da psicologia, preferentemente ao domínio físico" (L'Avenir Eminent, 1916, Editions Théosophiques, Paris). É digna de nota a antecedência com que isto foi proclamado relativamente ao grande interesse que muitos proeminentes vultos da ciência, desde há 30/40 anos, vêm demonstrando pela espiritualidade oriental. Não devemos omitir gratidão e justiça a quem a merece: talvez ainda hoje (os que não temos o estúpido complexo de superioridade da nossa desumana e, tantas vezes, brutal e tirânica civilização euro-americana) não nos tivéssemos apercebido dos tesouros da velha e profunda filosofia e psicologia oriental, se não fora a determinação pioneira de Helena Blavatsky, Henry Olcott, Annie Besant…
Todo o ocidental medianamente informado conhece a figura de Gandhi; porém, a cultura oficial continua a silenciar que ele só se tornou consciente do valor da sua Índia (que, até então, considerara vergonhosa) pela influência dos teósofos e, nomeadamente, de H.P.B. e de A.B. De resto, foi Annie Besant quem lhe preparou o caminho e propiciou a ocasião para que se tornasse conhecido, dando-lhe a palavra
na memorável inauguração da Universidade de Benares (a primeira que existiu na Índia), criada sob o impulso da Soc. Teosófica.
É difícil imaginar a magnitude da obra educacional realizada pela ST no Oriente, especialmente pela iniciativa do Cor. Olcott e de A. Besant - centenas e centenas de escolas foram criadas sob o seu auspício. No caso de Annie, revelou-se uma especial preocupação com a mulher indiana, incentivando e promovendo a sua educação (coisa singular há cem anos atrás). A par disso, transportava no seu coração um permanente carinho pela preservação dos melhores valores da Índia e pelo florescimento da sua cultura, filosofia e religião. Um dos seus trabalhos mais notáveis foi a elaboração de um livro de texto cujos princípios filosóficos e éticos acabaram por ser aceites pelos representantes das inúmeras correntes religiosas do hinduísmo - um formoso exemplo, na verdade.
A sua intervenção nos assuntos políticos da Índia (então ainda englobada no Império Britânico) foi tão determinante que ela - uma inglesa - foi eleita Presidente do Congresso Nacional Hindu. Criou e dirigiu vários jornais, onde sustentava ideias de autonomia e denunciava os abusos e violências dos britânicos, simultaneamente se batendo pela amizade entre os dois povos. Este equilíbrio granjeou-lhe não apenas o imenso carinho e respeito dos hindus - em muitas das suas casas, existiam retratos de Annie Besant ao lado de representações dos Rishis, Avatares e divindades do hinduísmo - mas também dos mais sensatos entre os ingleses. Um deles, Lord Haldane, Ministro da Justiça, considerou-a "o melhor estadista que já conheci". Algumas vezes, porém, as autoridades inglesas perturbaram-se com a sua actividade e chegou a ser-lhe fixada residência forçada (o que, segundo testemunho de um amigo, a fez estar como "um leão enjaulado" sofrendo pelo serviço que não podia prestar). Na sequência de uma onda de protestos, foi libertada e o seu regresso foi assim descrito, com rigor, por George Arundale: "… uma apoteose impossível de ser imaginada. Uma multidão imensa amontoava-se à sua passagem, formando um cortejo cada vez mais imponente. Aclamada pelas massas, atravessou povoados e aldeias engalanados como se se tratasse da descida de uma deusa. Flores adornavam os caminhos que os seus pés haveriam de pisar; em Bombaim, girândolas de objectos preciosos balançavam-se das casas e finas pérolas se lançavam à sua passagem. Foi uma contínua ovação, a expressão da entusiasta gratidão pela fiel amiga da Índia. Em Adyar, a sua chegada foi digna de uma epopeia".
Assim, Annie Besant é uma referência incontornável da história da Índia. Tal facto é plenamente reconhecido por Gandhi, Nehru e vários outros líderes indianos (oxalá, contudo, tivesse sido melhor entendida). A certa altura, Besant e Gandhi divergiram politicamente, o que nunca pôs em causa uma mútua admiração. Aquando do 1º centenário do nascimento de A. B., disse ele: "Quando a Dra. Besant veio à Índia e cativou todo o país, entrei em íntimo contacto com ela e, embora tivéssemos diferenças políticas, minha veneração por ela em nada esfriou. Espero, pois, que as celebrações sejam dignas dessa grande mulher". Ao contrário de M.Gandhi, Annie preconizava uma transição mais gradual e menos populista, dava prioridade a uma verdadeira reeducação dos hindus (que despertasse o seu antigo esplendor) e apostava no desvanecimento das tensões internas, sintetizando tudo na paráfrase: "Que valeria à Índia conquistar o mundo, se perdesse a sua alma?". O futuro mostrou que ela tinha razão…
Uma Autoridade Natural
Annie nunca teve receio de enfrentar o mundo para expor as suas ideias, sempre mais amplas. Era uma verdadeira força, falando, escrevendo e actuando com um saber fazer tão aprimorado, que se constituía como uma autoridade natural, cheia de encanto e afecto e, todavia, de sóbria altivez - que nunca soberba - diante da limitada mentalidade comum. Como invariavelmente acontece com todos os grandes pioneiros da evolução humana, sofreu vários dissabores e muitos ataques - mas sempre pela calúnia e pelo ardil, jamais com galhardia e ombridade. Mesmo as clivagens entre terceiros (seus colegas de trabalho) se aplacavam "por respeito a Mrs. Besant", "por consideração por Mrs. Besant" ou simplesmente se desvaneciam diante da sua presença tão digna e poderosa. Tal só deixou de acontecer quando, no crepúsculo da existência, o seu coração de leão se despedaçou e caiu enferma.
A Ardente Peregrina
Alguém escreveu um livro sobre Annie Besant com o título "The Passionate Pilgrim". Tal ela foi - uma ardente peregrina, uma apaixonada guerreira que jamais se permitiu deixar perder o estandarte que se lhe confiara. Usando uma expressão popular, dela se pode dizer que "não brincava em serviço". O seu ritmo de trabalho era impressionante: cerca de 15 horas por dia, mesmo em plenos 80 anos. Que grande, que extraordinário exemplo de quem, não obstante, tinha uma vida interior tão rica e preciosa! Para nós, Annie Besant representa o poder e a inspiração de um mar imenso de estandartes de todas as cores, inscritos com os mais belos símbolos da criatividade humana.
O final da sua vida, entretanto, ficou ensombrado pela dor imensa de ver - justamente quando as forças, enfim, lhe começaram a escassear - como alguns daqueles em quem mais depositara o seu amor e a sua espe-rança enveredavam por atitudes insensatas, de extremos opostos (e, por isso, conflituantes). Em 1931, perto dos 84 anos, como resultado de uma queda, enfraqueceu a ponto de passar grande parte do tempo acamada. Reuniu todas as forças que lhe sobravam para a Convenção Teosófica do final de 1932 e, a partir daí, a sua força vital foi-se abstraindo, até falecer, em 20 de Setembro de 1933 (homenageada, nos dias seguintes, por dezenas de milhares de pessoas), com quase 86 anos de uma existência consagrada a estudar, amar e servir. Ao seu lado estavam dois dos companheiros que, apesar de tudo, melhor puderam compartilhar do seu labor e dos seus anseios: C.W.Leadbeater e (segurando-lhe a mão) C.Jinarajadasa, que viria a ser Presidente da Soc. Teosófica entre 1946 e 1953. No órgão oficial desta instituição, no número de Outubro de 1933, culminou-se o anúncio da morte de Annie Besant com estas palavras:
"Volta em breve, ó combatente, e comanda-nos uma vez mais!"
Tentar Outra Vez
O que se segue poderá ser entendido como uma ficção sobre acontecimentos post-mortem…
M., K.H. e Outro esperavam por ela, que rapidamente se elevou até ao Devachan, estado onde, contudo, não tinha interesse em permanecer - como descansar, se há tanto a fazer?!
Então, reencontrou H.P.B. - quase todas as noites o fazia, mas agora era diferente. Como 44 anos antes, Annie curvou-se para lhe beijar as mãos, sussurrando: "Desculpa. Falhei…". Helena ergueu-a, enquanto os olhares se fundiam - num estado mais acima de uma profunda comoção - e, abraçando-a, disse: "Não, não falhaste. Foste digna e admirável. Quem faria melhor, se não Eles? Bem sabes, tivemos contra nós todos os poderes do mundo, todos os poderes da sombra, e quantas traições! Sim, vê bem, não te iludas, mesmo o teu amado ---- traiu por omissão e por vaidade mascarada de humildade; e ---- e ---- e ----, traíram por acção leviana; e tantos outros, por inércia, tibieza ou ingratidão, igualmente traíram. Mas tu, Annie, foste sempre honrada e autêntica - oh, como lutaste pela Causa Sublime!".
Também Eles estavam presentes e, naquele plano e naquela envolvência, Annie sentiu-se reconfortada. No entanto, disse ainda: "Mas não conseguimos a grande mudança. Não conseguimos vergar o peso dos valores da ignorância. Desafiámos o mundo - e perdemos!…".
Helena sorriu. Tomou-lhe de novo as mãos e respondeu: "Não, Annie. Foi o mundo quem perdeu.
Bem sabes, sempre perdeu quando ganhou, permanecendo como o vale sombrio, o lugar de Myalba. Lembra-te, já muitas vezes foi assim - mas, a pouco e pouco, os muros da grande Babilónia vão-se rompendo. E olha, vamos sendo mais… Alguns prosseguem o trabalho, até que voltemos".
A presença de Annie iluminou-se mais intensamente. Sentiu-se pronta para a batalha e sorriu quando H.P.B. lhe sinalou as palavras "Volta breve, ó combatente…". Então, perguntou: "Iremos juntas?". "Não necessariamente" disse HPB, "e serás tu a ir primeiro". Annie quase se entristeceu, porém logo H.P.B. prosseguiu: "Mas eu estarei sempre por detrás de ti. E irão outros, ----, ----, ----, e o caminho estará um pouco mais facilitado - e nós mais experientes, é claro. Olha, contempla o Plano. Nada se perdeu, algo se avançou. Annie, VAMOS TENTAR OUTRA VEZ!"
José Manuel Anacleto
Presidente do Centro Lusitano de Unificação Cultural
Referências Bibliográficas:
1. Besant, A., "Autobiografia", Ed. Pensamento, São Paulo (todas as citações de Annie Besant contidas no texto, salvo indicação em contrário, são retiradas deste livro)
2. Olcott, H., "Old Diary Leaves" (Vols. IV a VI), Theosophical Publishing House, Adyar
3. Jinarajadasa, C., "A Short Biography of Annie Besant", Theosophical Publishing House, Adyar
4. Jinarajadasa, C., "The Golden Book of the Theosophical Society", Theosophical Publishing House, Adyar
5. Ransom, J., "A Short History of the Theosophical Society", Theosophical Publishing House, Adyar
6. Besterman, T., "Ms. Annie Besant: A Modern Prophet", Kegan Paul, Trench, Trubner and Company, London
7. Prakasa, S., "Annie Besant, as a Woman and as a Leader", Theosophical Publishing House, Adyar
8. Nethercote, A.N., "The Last Four Lives of Annie Besant", Hart-Davis, Londres
9. West, G., "The Mind of Annie Besant", Theosophical Publishing House, Adyar
10. "Portugal Teosófico", nºs 68 e 71, Sociedade Teosófica de Portugal, Lisboa
11. "Biosofia", nº 1, Centro Lusitano de Unificação Cultural, Lisboa